Os membros anteriores possuem duas funções principais entre outras: fornecer apoio ao movimento que nasce dos posteriores (propulsão) e, acompanhando os movimentos de lateralidade do pescoço e cabeça, permitir a mudança de direção. Os ossos principais que formam o esqueleto do membro anterior são: escápula, úmero, rádio e ulna, carpo, metacarpo e falanges. A escápula corresponde a região dos ombros e sua ligação com o tronco é feita exclusivamente por músculos, não existindo articulação óssea (nos animais em geral, não existe a clavícula ou, quando muito, é apenas um resquício). A porção superior da escápula se completa com uma lâmina de cartilagem (coroa da escápula) que em correspondência com as primeiras vértebras torácicas forma a região da cernelha – ponto mais alto do corpo do animal, relacionado à altura que consta nos padrões raciais. Na outra extremidade a escápula articula-se com o úmero que é o osso do braço, formando a articulação do ombro (articulação escapulo-umeral). Na porção média da escápula, acompanhando o seu eixo maior, aparece uma crista óssea chamada de espinha da escápula, que basicamente serve para aumentar a área de inserção muscular e reforçá-la. O ângulo ideal mantido pela escápula em relação à coluna vertebral é de 45 graus; ângulos maiores tendem a verticalizar a escápula levando a cernelha muito proeminente ou, por compensação, a frentes retas devido a abertura da articulação escapulo umeral, ao contrário, ângulos menores tendem a horizontalizar a escápula e, nestes casos, teremos a chamada cernelha plana e aberta pois, as coroas escapulares estarão mais distanciadas em função da curvatura do tórax, sobre o qual os escápulos também podem a levar a defeitos de ombro. Por outro lado esses aspectos podem ser condicionados não por alteração de ângulos articulares mas por um deslocamento total do conjunto. De fato, não existindo articulações ósseas, há predisposição para que o ombro se desloque para a frente ou para trás (mais raro). De qualquer forma ficam alteradas as relações da escápula com o tórax, ainda mais, um ombro deslocado para a frente pode sugerir defeitos de pescoço, principalmente quanto ao seu tamanho e inserção, dando também a impressão de que o cão é longo demais e/ou não tem antepeito bem formado.
A articulação do ombro tem como ângulo ideal o de 90 graus. Considerando o ombro em posição, os ângulos mencionados de 45º e 90º permitem que uma perpendicular ao solo traçada a partir do centro da espinha da escápula caia exatamente no centro da almofada plantar, mantendo-se paralela aos ossos do antebraço, que são o rádio e a ulna (linha vermelha na figura abaixo). Essa disposição é muito importante pois permite ao animal manter-se em pé com o menor esforço possível, dado o equilíbrio de torres entre os músculos extensores e flexores. Na verdade este aspecto constitui o que chamamos de aprumos e a natureza procura mantê-los a qualquer custo, acomodando a escápula e o úmero à largura da caixa torácica ou, inclusive, alterando a forma final de alguns ossos longos, como no caso dos “patas curtas”, para que a perpendicular seja respeitada nos seus pontos extremos – centro da espinha da escápula e almofada plantar.
Visto de lado (famoso “side gait”), podemos notar que os cães de boa velocidade tal disposição permite que a articulação do cotovelo, entre o úmero e o rádio-úlna, seja colocada ao nível da linha inferior do tórax, ou mesmo um pouco abaixo, o que facilita os movimentos amplos necessários ao galope – por isso muito cuidado em falar em cotovelos soltos nos galgos em geral – ao contrário, nos cães baixos, a articulação do cotovelo, pelo encurtamento dos ossos, coloca-se acima da linha inferior do tórax e os movimentos são mais firmes porém de menor amplitude.
Considerando o movimento do membro como um todo, tais angulações e aprumos também resultam em economia de energia; de fato, neste caso, o membro funciona como um pendulo cujo centro ideal é o centro da espinha da escápula. Na realidade a escápula sofre apenas ligeira rotação, cabendo o efeito à abertura ou ao fechamento da articulação escapulo umeral; lembrando a relação do paralelismo entre a linha ideal e os ossos do antebraço vemos que toda a força de contato com o solo passa rapidamente para a raiz do membro. Além disso, se traçarmos uma linha acompanhando a espinha da escápula até o solo, podemos determinar o alcance máximo do passo do animal com um único movimento. Não é difícil deduzir que alterações dos ângulos articulares considerados vão influir nesse alcance. Assim, por exemplo, se o ângulo escapulo umeral for maior que 90º, o passo é mais curto mas a seqüência dos passos é mais rápida. Na maioria das raças é um defeito mas, em algumas, é desejável (Fox Terrier, dobermann). Ao inverso, um ombro muito fechado projeta a linha para mais longe do apoio. Teoricamente o alcance é maior mas, na prática, esse alcance é maior do que o próprio comprimento do membro que, assim, termina o movimento em pleno ar. Nesse caso o novo apoio far-se-a com impacto, o que cansativo e estressante que bate com a almofada plantares no solo (“padding”) ao invés de apóia-las harmoniosamente. Algumas raças apresentam movimentos especiais nos membros dianteiros; além das apontadas (passos curtos), o mais típico é o do Pinscher Miniatura em que todas as articulações, inclusive os dedos, flexionam-se exageradamente levantando todos os membros e resultando em passos curtos e rápidos. Esse movimento é chamado de “hachney” e está intimamente associado a estrutura do membro. Semelhante, porém não igual ao hackney é a chamda ação alta (high action). Neste caso, e é sempre defeito, o anterior não tem condições de compensar a propulsão dos posteriores. Para que os pés não se choquem (posteriores x anteriores), o animal retira rapidamente os anteriores do solo, levantando-os exageradamente mas sem as flexões acentuadas do “hackney”. Esta movimentação é vista como correta no Greyhound Italiano pela acentuada curvatura da coluna que, mesmo em movimento, não se desfaz totalmente. De qualquer forma ela também pode aparecer, transitóriamente, no início do movimento de qualquer raça de coluna convexa, mas desaparecendo à medida que a propulsão dos posteriores se equilibra com com a resposta dos anteriores e a coluna se acomoda. Nestes casos , a sua manutenção durante todo o movimento é defeito (em caso de dúvida faça o animal dar uma volta mais ampla). Ela também é insinuada no Ibizan Hound, no qual se pede um trote alto.
Devemos considerar agora a região do carpo e metacarpo. O carpo é constituído por duas fileiras de ossos, num total de sete e, como já mencionamos anteriormente, serve para dar maior flexibilidade a região (corresponde ao nosso punho) e amortecer os impactos que são transmitidos ao conjunto rádio-ulna e daí a raiz do membro. Externamente e na porção posterior, aí encontramos uma formação fibrosa, revestida de pele muito espessa, sem pelos, que é chamada de coxim ou almofada carpal, cuja função é proteger o carpo de choques com o solo, na eventualidade de flexões exageradas durante o movimento (principalmente em velocidade, quando o impacto é maior). Na seqüência temos a região do metacarpo (corresponde a nossa palma da mão) e é formada por quatro ossos (se não considerarmos o quinto dedo) que na realidade é o primeiro, o nosso polegar. O comprimento desses ossos varia conforme a raça, de modo geral, são mais longos nos cães de velocidade e mais curtos nos cães de força ou de anteriores e posteriores curtos. Considerados como um todo apresentam uma ligeira inclinação relativamente ao eixo do membro. Essa inclinação favorece o efeito de amortecedor do conjunto e sua alteração condiciona movimentos “duros”, se for muito reto ou, ao contrário, “pesados” se for muito inclinado. Algumas raças, entretanto, pedem metacarpos bem perpendiculares ao solo (Foxhound) ou nitidamente inclinados (Pastor Alemão). Muitas vezes é a este nível que notamos desvios de aprumos quase sempre decorrentes de problemas ao nível de ombros deslocados para frente ou tórax estreito, sem apoio para os cotovelos, exigem que o animal coloque os pés para fora para garantir o equilíbrio. Ao contrário, tórax muito longo (quando defeito) tende a afastar os cotovelos e os pés se voltam para dentro. Os desvios também podem acontecer por ligamentos pouco resistentes ou torções ósseas (em cães novos nos quais o tórax ainda não está totalmente desenvolvido ou os ligamentos são mais frouxos esses desvios devem ser cuidadosamente considerados). Finalmente temos as falanges, que são os ossos dos dedos e que veremos mais adiante.
Olhando o animal de frente, em movimento, notamos que a tendência dos anteriores é aproximar as extremidades. Isso decorre da procura de uma estabilização de tal maneira que o centro de gravidade se desloque em linha reta, de trás para frente, facilitando o movimento. Ao caminhar com os membros separados o centro de gravidade oscila também de um lado para outro, isso é normal nos movimentos mais lentos. Lembrar que nas raças de tipo compacto e tórax muito largo como o Bulldog por exemplo, essa aproximação é relativa, não devemos confundi-la com movimentos defeituosos em que os anteriores cruzam, passando de um lado para outro, quase sempre em decorrência de ombros e cotovelos mal colocados, inclusive por tórax estreito.
Pure Breed Dogs - 2003 - Glover, Harry - Irewin Copplestone
Dog Standards Illustred - 1977 - Wagner, Alice - Howell Book House, Inc.
Dog Locomotion and Gait Analysis – Curtis Brow
Dogsteps – A New Look – 3ª Edition
Ilustração adaptada de Siberian Husky - The Family Album - Debbie Meador
Tradução, Pesquisa e Edição - Leandro Jorge - Direitos reservados.